A poesia transcendental, transcarnavalesca e original de Everton Cidade
Acaba de ser publicado pela editora Folheando, do Pará, o novo livro do poeta e músico Everton Cidade. A coletânea de poemas intitula-se Cohab Goya e encontra-se atualmente em pré-venda.
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O título faz alusão à Cohab-Feitoria, bairro de São Leopoldo onde o autor viveu (e este que vos escreve) maior parte da sua vida. A periferia, porém, não é meramente um adereço, ela está impregnada na linguagem, na verve. Em forma às vezes cifrada, às vezes escancarada, o vocalista da banda Santo Suzuki, destrincha o cotidiano de um poeta maldito.
Sua escrita tem certa rispidez e crueza. Para os desavisados, ler a poesia marginal, lo-fi do Cidade é como pisar em espinhos, descalço. O sangramento é quase inevitável. Em compensação os seus leitores certamente gostarão de sentir essa dor.
A poesia transcendental, transcarnavalesca e original do poeta leopoldense vai além, e é uma punhalada certeira no coração da literatura banal, acostumada a lirismos fáceis, a metáfora arcaicas. É um soco na boca do estômago dos puritanos adeptos de versinhos de amor. Mais: Cohab Goya é um chega para lá na linha de montagem comercial literária, acostumada a produzir livros engessados que visam o lucro acima da arte.
Se a poesia fosse uma igreja, Bukowski, Whitman, Ginsberg, Blake, Leminski seriam seus profetas. Cidade, por sua vez, certamente é candidato a beato. Basta que não caia na tentação do sentimentalismo e um dia poderá ser santo.
Para quem quiser saber mais sobre a sua poesia, ele produziu em 2020 uma série de vídeos chamado PALIATIVOS PSÍQUICOS. São 10 videopoesias produzidas por ele (poesia e voz) e Ícaro Estivalet (som e imagem) com auxílio do edital emergencial para cultura do município de São Leopoldo/RS.
Os vídeos com os poemas podem ser encontrados no Canal Freak Sound: https://www.youtube.com/channel/UC2NctHO0b1X976Tlh2F5EfA
Abaixo 3 poemas de Everton Cidade extraídos do livro Cohab Goya:
2/.
Uma diáspora
Uma
Em pobreza
Que nos adora
Em fraqueza
Nos acavalou
Com a gentileza
De uma espora
Nessas casas feitas à faca
Nesses prédios onde cama é maca
Fomos realeza por uma hora
Mas a tragédia
Nos namora.
...
14/.
Proezas
Pra catar
Beleza alheia
Ouvindo rock ruim
Achando bom
Era o que tínhamos
E com uma cachacinha
Era bom assim
Fins de semana
De santa ceia
Pra maldizer
Em amor quem nos chateia
...
1/.
Cohab, que tão pouco
Se sabe os segredos
Fui serpente desde cedo
Fui o louco, a mãe do medo
O menino afiando os dedos
Roubando carros
Com dor de dente
Trampando
Onde meu pai era gerente
Filho de loba mamando
Tetas das gentes
Que a tristeza segue
Bancando
Como cabelos
Presos num pente.
Sobre
Everton Luiz Cidade é músico e escritor, natural de São Leopoldo/RS. Publicou os livros Santo Pó/p (MAKBO Editora), QuiÓ (oVo e GoDie), Bonde Transmutóide (Vibe Tronxa Comix) e ApareCida (Meu Santo Vendedor). Escreve nos blogs das rádios Armazém e Rockpedia e nos jornais No Palco e Seguinte.
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